Projeto Reflorestando a Caatinga promove capacitação em restauração da Caatinga
Ministrada por vice coordenadora da Reserva da Biosfera, Aleksandra Lacerda, iniciativa abordou técnicas de produção, manejo e plantio de mudas de espécies nativas do Bioma
A conservação da Caatinga é fundamental para a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e o combate à desertificação. O Projeto Reflorestando Unidades de Conservação e suas Zonas de Amortecimento para Restaurar a Biodiversidade e Fortalecer as Iniciativas Socioprodutivas da Caatinga está investindo em inovação e conhecimento como forma de alcançar o objetivo de plantar 500 mil mudas em 11 Unidades de Conservação do Estado de Pernambuco.
Como parte de seu plano de ação para o fortalecimento do conhecimento a equipe técnica da Fundação Araripe e dos Parceiros institucionais participou de uma capacitação em Práticas Florestais, ministrada pela especialista em restauração Alecksandra Vieira de Lacerda, vice-presidente da Reserva da Biosfera e Professora Associada do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), A equipe técnica do projeto passou um dia inteiro no Laboratório de Ecologia e Botânica da UFCG aprendendo técnicas de campo, desde a produção das mudas, sua manutenção, transporte e plantio. Visitaram ainda os viveiros de muda e de pesquisa da instituição.
Nesta entrevista, ela destaca a importância de projetos como o Reflorestando a Caatinga para a conservação do bioma e seu impacto para a mitigação das mudanças climáticas.
A Catinga é um bioma exclusivamente brasileiro. Qual a importância da sua conservação para a mitigação das mudanças climáticas?
Alecksandra Vieira de Lacerda – O Bioma Caatinga apresenta uma grande variabilidade de paisagens e uma riqueza biológica com elevado nível de endemismo, com ajustes aos ciclos sazonais característicos dos seus espaços. Dessa forma, na linha do tempo, os marcadores de respostas da sua diversidade expressam resistência e resiliência quando relacionados aos períodos secos que anualmente se apresentam nessa região. Nesse sentido, nossas espécies e o nosso solo nos ecossistemas são importantes na sua relação com o carbono. A conservação dos nossos sistemas biofísicos se mostra importante dentro das ações que envolvem a mitigação das mudanças climáticas. Precisamos de forma urgente trabalhar com a conservação no Bioma Caatinga, ela é estratégica nesse cenário das mudanças climáticas e no combate à desertificação.
A Caatinga vive sob condições climáticas extremas. Como se dá sua adaptação a esse cenário?
AL – Os ecossistemas da Caatinga foram sendo trabalhados no tempo e no espaço para os ajustes adaptativos e assim manter o seu equilíbrio. Considerando o livro que acabei de publicar “Semiaridez Brasileira: uma riqueza não revelada”, coloco que os componentes bióticos selecionaram peculiaridades adaptativas, tornando os recursos vivos compatíveis com as condições ambientais a que estão sujeitas as espécies. Tais peculiaridades se relacionam com o ajustamento ecológico, implicando características anatômicas, morfológicas, fisiológicas e fisionômicas, e com a seleção taxonômica, traduzida no endemismo genérico e específico. Por conseguinte, nessa região, todos os processos de história de vida, crescimento e reprodução são adaptados nos seus ciclos e formas às condições físicas e ambientais, o que aumenta a eficiência e diminui os riscos.
Você ministrou uma capacitação sobre como produzir mudas e plantá-las. Quais são as particularidades da Caatinga neste sentido?
AL – Estou como coordenadora do Laboratório de Ecologia e Botânica – LAEB/CDSA/UFCG e estamos com espaços de produção vegetal considerando as espécies da Caatinga. Estamos preocupados em desenvolver as tecnologias de produção ajustando aos vetores de alta eficiência e baixo custo. Ressalto que, em termos de Caatinga, existe muitas lacunas dentro do eixo da produção vegetal, ou seja, o conhecimento ainda é baixo e precisamos avançar para contribuições em escalas, considerando a restauração de ecossistemas degradados. O nosso Grupo de Pesquisa – Conservação Ecossistêmica e Recuperação de Áreas Degradadas no Semiárido – CERDES, o qual estou como coordenadora, tem se voltado para preencher os campos lacunares e contribuir com a reversão da degradação no cenário do Bioma Caatinga.
Quais os principais cuidados necessários para garantir que o plantio seja bem-sucedido?
AL – As ações que envolvem produção vegetal são muito complexas porque estão ajustadas a ecologia de cada espécie de referência que é trabalhada. No geral, precisamos estar observando cuidados que envolvem as sementes, para garantir lotes de produção com qualidade desejável. Os materiais que serão usados na produção também são importantes porque, por exemplo, muitas espécies têm exigência específica considerando substratos e suas variações nas proporções. A quantidade de água aplicada no sistema de rega é outra questão importante porque as espécies e os seus sistemas ecofisiológicos são variáveis. Os cuidados com pragas e doenças também são importantes na rotina de produção vegetal e assim evitamos perdas de lotes de produção.
Quais são as espécies são mais importantes para a conservação do bioma?
AL – Ressalto que na Caatinga todas as espécies são importantes devido aos serviços ecossistêmicos. Nestes espaços, a variabilidade de formas de vida contribui para o equilíbrio dos sistemas ecológicos e assim precisamos construir planos de proteção e conservação aliados à questão da sustentabilidade econômica nos nossos espaços.
O que a conservação da Caatinga pode gerar de aprendizado para a conservação de outros biomas brasileiros?
AL – Considero que as ações trabalhadas no eixo da conservação da Caatinga podem definir linhas e percepções de que não existe a necessidade de alterar os padrões físicos, climáticos e biológicos dos ecossistemas da região. A necessidade que se registra é a ampliação dos conhecimentos relacionados aos padrões dos sistemas naturais, respeitar as suas peculiaridades e assumir o uso da diversidade biológica dentro dos princípios da sustentabilidade e, desta forma, garantir o acesso aos seus potenciais econômicos sem comprometer os fatores de existência e permanência dos recursos naturais e dos serviços ecossistêmicos. Nesse sentido, todos os nossos biomas podem trabalhar nessa plataforma de percepção voltada para a construção de planos para o desenvolvimento regional.